As festas de ano novo dobrando
a esquina. Queima de fogos, lista de intenções.
Falando em intenções, quero
então fazer uma lista de desejos para o ano que se achega. Ao contrário do que
se acredita, desejos a gente revela, sim, para que os outros desejem conosco
olhando para a mesma estrela. Assim podemos dar vida às palavras de Dom Helder,
aí em cima na epígrafe.
Então, que em 2012 a meta
primeira de todas as pessoas seja atingida. Ticar mais um xiszinho nas tarefas
a realizar na vida é sempre gratificante. Muitas vezes, dessa meta dependem
outras metas, metas-corolárias – corolária é uma palavra difícil, mas linda.
Que em 2012 as pessoas amem
mais e sofram menos por causa de outras. Que entendam que há sempre um caminho
para felicidade, mesmo que o que as leve para lá não seja aquele trajeto tão
cuidadosamente planejado. Que descubram, no novo e por vezes improvisado
caminho, o riacho límpido que perderiam se não houvesse o desvio feito a
contragosto. E que não destruam o caminho caminhado, pois foi ele que lhes
trouxe até aqui.
Que em 2012 possamos dar
continuidade ao trabalho que estamos desenvolvendo no nosso espaço
profissional. Há uma sede desértica e uma fome de mudança africana por mudanças
qualitativas na sociedade. Que possamos nos regozijar com uma esperada justiça
social – regozijar também é uma palavra linda.
Que em 2012 quem se perdeu
se ache. Quem se achar, se curta. Quem se curtir, que sonhe. Que use como
barômetro da vida não as pequeninas coisas do dia a dia, as más e mesquinhas,
mas as pequeninas coisas do dia a dia, as boas e agradáveis. Que, assim, nosso
bem-querer e nossa disposição em viver nossa vida, única e nossa, beijem a boca
e despertem do sono a Pollyana bela e adormecida que existe em cada um de nós.
Robertocarlianamente, é preciso saber viver. Sonhar não custa nada, frase
trivial e tão verdadeira. É da trivialidade que surgem os geniais insights.
Devemos olhar com cuidado o comum que nos cerca, pois ele guarda surpresas
inimagináveis e mudanças de vida impensáveis.
Que em 2012 as inevitáveis
lágrimas que rolarem em nossas faces sirvam para enxágue da alma. Que sirvam
para limpar os olhos dos travos de amargura que porventura tenham tocado a boca
de nosso espírito. Que as lágrimas vertidas sirvam para regar o verde do jardim
de nossa alma, por vezes cinzentas. A dor é o maior aprendizado do ser humano.
Sempre haverá algo a doer. Quanto mais cedo reagimos e aprendemos a
domesticá-la, mais cedo creio que seremos mais serenos e lépidos diante das
drummondianas pedras no meio do caminho.
Que em 2012 novas pessoas
especiais surjam em nossas vidas. A cada ano, acredito, um bom punhado delas é
colocado a dedo no traçado de nossa existência com alguma missão que só muito
mais tarde descobriremos. Ou não. Pessoas que simples e profundamente nos fazem
bem. Pessoas cujo simples cruzar de olhar já dá um tom especial à melodia do
nosso dia até então desafinado. Pessoas que fazem o coração jovializar surpreso
e agradado ao vê-las inesperadamente e que levam esse mesmo coração a esperar
ansioso pelo próximo encontro. Pessoas que atrasam nossas programações mais
mundanas por conta de suas inestimáveis companhias, quase divinas. Pessoas
especiais a quem nossa linguagem chama autonomamente de amigas, independente do
tempo de convívio. Pessoas como essa em quem você está pensando agora.
Que em 2012 as velhas mágoas
se aposentem e vão curtir a vida em qualquer outro lugar. Que abram vaga nova
no coração, onde nunca deveriam ter ocupado assento. Que em seus lugares,
alegrias joviais e cheias de gás, recém-nascidas ou formadas, assumam e sintam
o prazer em servir doses sem medida de paciência, tolerância e carinho em
relação aos que nos circundam.
Que em 2012 aquele velho
amigo que se pôs distante ponha-se achegado. Que as gargalhadas e risadagens
compartilhadas e registradas no amarelado álbum do tempo, e suspensas pelos
rumos da vida, retomem seu viço e seu som estridente de então, quando lágrimas
corriam soltas lavando a alma de felicidade. Uma amizade resgatada é como uma
nota de cinquenta achada no bolso daquela bermuda que há muito a gente não usa:
alegra e permite a retomada de planos. E que também aquele amigo que se porá
distante no ano que entra não se desachegue. Que vá, mas fique, deixando sua
presença fraterna no lugar de sua presença física. Deixando seu cheiro em nossa
alma para a lembrança eterna.
Que em 2012 aquele velho
projeto secreto tenha sua vez. Ele sempre esperou quietinho por ela. Chegou a
hora. Desengavete-o!
Que em 2012 seja o Ano
Internacional do Reencontro. Reencontro consigo, com seus amigos, com sua
família. Reencontro com aqueles de quem nos desencontramos por causa da teia
dos acontecimentos cotidianos. Reencontro com aqueles de quem nos perdemos no
tumulto da multidão dos fatos. Reencontro com nossos valores mais pueris de
solidariedade, afetividade e humildade. Reencontro com Deus, grande maestro do
show da vida e de vida que nos cerca.
Que 2012 seja o ano da
virada. Seja lá qual for essa virada. Desde que seja para melhor. Que seja o
ano do recomeço, seja lá o que for que precise ser recomeçado. Rupturas virão,
ao certo, mas novos laços imediatamente surgirão para não deixar o entremeado
tecido da vida roto e maltrapilho. A roupa que veste a vida espelha a aura que
reveste a alma. E vice-versa.
Que 2012 seja o ano da
coragem. Da coragem de rever autocriticamente nossas pisadas de bola e nossas
mancadas, sem punições ou autoflagelos. Quem não dá testadas nessa vida de
quando em vez? Que sejam momentos de introspecção positiva. Momentos de rever
nossos planos, conceitos e preconceitos daninhos. Coragem para, tudo revisto,
assumir posturas claras. Coragem para não esquecer que ninguém é eterno e que a
vida é efêmera como uma florzinha no campo. Exatamente por isso não vale a pena
ficar ruminando em cima daquela questiúncula miudinha e pequena. Coragem para
dizer diretamente o que tem a ser dito, mas de forma tranquila, serena e
verdadeira, como só os corajosos sabem fazer. Os fracos de alma sentem a necessidade
de dizer por terceiros, de mandar recados. Aliás, não é necessidade: é falta de
opção. É a única forma que sabem fazê-lo. Então, que aprendam outras formas em
2012.
Que em 2012 aquele dia anual
de cabeça quente sirva para aquecer o coração. Explodir para quê? Que o calor
da cabeça gere energia termoelétrica para processar as perguntas sem respostas,
refletir a vida, refletir as tomadas de rumos, refletir os novos momentos e sua
significação. Refletir a reflexão. Dormir antes de decidir.
Que 2012 seja um ano de
tolerância. Que se perceba que as pessoas são diferentes e que nessa diferença
reside a beleza de uma relação. Mapear o amor que sentimos e que funda nossa
relação com os outros é uma das tarefas mais primordiais e gostosas de qualquer
relação. É bom demais construir nossa história, riscar nossos corações nas
árvores dos fatos, nas calçadas da mente. E lembrar, sem dramas, que cada um às
vezes precisa de um minuto sozinho no seu cantinho. Não é nem preciso
verbalizar essa necessidade para o outro. O amor proficiente no amor aprende a
ler silêncios, textualizar olhares, significar sorrisos e gestos. Enfim,
compreende a necessidade de transcender as palavras enunciadas. O não-dito
grita o que as palavras calam.
Que em 2012 aquele velho
conselho de Victor Hugo prevaleça: tenha dinheiro, mas não esqueça quem manda
em quem. Dinheiro é conseqüência e não meta. Pense nisso, mas não se
desvalorize enquanto profissional. A felicidade no trabalho é elemento
importante para o equilíbrio da felicidade global, mesmo que por vezes ela
pareça encurralada por desânimos e sensações de imobilidade. Os ritmos das
pessoas para a cadência da vida são diferentes: alguns sambam, outros valsam.
Alguns bregam com Michel Teló, outros viajam na mais deliciosa MPB. Ninguém muda
tudo, mas alguma coisa se muda. Concentre-se nesse alguma coisa e toque a canoa
que o chibé lhe espera.
Que em 2012 as pessoas façam
algo que nunca fizeram. Ou porque não gostam ou porque não tiveram chance. Que
descubram nessas coisas diferentes um prazer diferente. Que tomem Guaraná Baré,
comam tucumã no pão, bife com ketchup. Que criem coragem para provar Yaksoba e
berinjela. Que assistam filmes do Almodóvar , experimentem uma bala de
araçá-boi. Que se desapoquentem ouvindo Jorge Aragão ou Carpenters. Que
assistam ao Domingão do Faustão e se deliciem com aquelas velhas
videocassetadas de dez anos atrás. Que tome um delicioso banho de chuva a dois
ao som de “Que maravilha”, cantada pelo Toquinho. Que leia um livro à cama,
trocando calorzinho pelos pés que se chamegam por baixo do edredom. Que comam o
doce abio e riam juntos do beijo de boca grudenta que a fruta proporciona. Que
riam dos outros e, acima de tudo, riam de si. Aprender a ri de si é
fundamental.
Que em 2012 a saudade venha
e venha forte. Só sente saudade quem viveu intensamente. Que haja vida intensa
no ano que rebenta. Que essa intensidade não signifique assoberbamento, mas
compactação, viçosidade e viscosidade ao vinho da celebração aos fatos. Que
brindemos à vida sem ficar de porre, mas apenas levemente felizes.
Que 2012, enfim, seja seu
ano. Ao desejar um 2012 maravilhoso, peço a você que me lê para não esquecer
algo fundamental: de bater um papo com Deus nas suas mais diversas formas.
Sempre faz bem.
Meu último, mas nem por isso
menos importante, desejo é o de que em 2012 minha lista de desejos tenha apenas
uma frase: um 2013 igual a 2012: feliz. Aliás, feliz é uma palavra muito linda.
Sérgio Freire
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