Incrível como nós, mulheres,
corremos atrás e ao mesmo tempo rejeitamos a perfeição. Explico. A todo custo,
todo santo dia, a mesma luta que inclui trabalhar bem, ser ótima namorada, boa
filha, aluna exemplar e sem perder o estilo ou sair pra rua sem a convicção de
que somos demais (ai da moça decidir de sair casa já se achando lixo: tende a
terminar o dia na pior). E a gente se esforça sempre pra conseguir ser mais
aceitas, melhor remuneradas, com menos celulite e o ouvido cheio de elogios.
Normal. O que me intriga é a falta de tato ao lidar com o bom senso dentro de
um relacionamento. Explico de novo: nos desestabilizamos. Cadê a capa de
supermulher que a gente veste toda manhã pra encarar uma piranha curtindo todas
as fotos do namorado? Existe paciência em aceitar sem pestanejar um pouco de
carinho sem o medo cruel de que seja puro sentimento de culpa? Ou, para
resumir: tem como nós, da classe feminina, abonarmos o martírio de nós mesmas e
nos aceitarmos incríveis com caras que achem o mesmo sem surtar por uma demora
em responder mensagem? Tem, claro que tem. Só falta a gênia que habita
interiormente descobrir.
Sabemos que não existe maestria
completa nessa vida. Mesmo assim, andamos com pressa, nos alimentamos
corretamente, travamos os impulsos mais sentimentais, nos concentramos à base
de pílulas para não nos tornar "gordas" psicóticas mal sucedidas -
porque é assim que dá medo que nos encarem, com as piores qualidades possíveis.
No meio do lapso moderno de vida, respiramos, enlouquecemos, queremos só mais
um pouquinho de amor, só mais um tantinho de dinheiro para conseguir juntar
para aquela viagem que fica sempre para o próximo feriadão e não ocorreu até
hoje. Por dentro, sofremos feito passarinho no ninho, emaranhadas dentro dos
problemas de criamos, entremeados na teia fininha de quem quanto mais faz, mais
deseja acertar e assim, mais se enche de encucamentos e autoanálises profundas
que dão em nada. E quando o trabalho não está lá essas coisas, as amigas são
poucas mas, engraçadas e de bom coração, a grana anda curta e a família
julgadora, é no amor que a existência escolhe a maior estampa (que a gente lava
na máquina pra ver se não estraga, que a gente estica e puxa pra ver até onde
vai, que a gente testa sem querer e usa por vários dias pra ver se enjoa - e
continua ali, firme e forte porque só homem de caráter forte pra aguentar tudo
isso e seguir do lado, chamar de louca pra logo em seguida esmagar muito e
dizer "chatinha" como quem responde em silêncio que aceita as
burocracias porque a parte boa vale a pena.
Toda essa explicação pra afirmar
que, sim: fomos educadas desde pequenas tendo a certeza que homem não presta é
nada, que é preciso "confiar desconfiando", que cara quieto demais
ih, filha, toma cuidado e presta bem atenção porque o chifre cresce e todos
veem, menos nós, as meninas do papai. E alguns podem mesmo até representar uma
parcela de 20 ou 30% de filhos da puta, otários ou mongolões que não veem a
benção em forma de mulher que dá a mão na hora de caminhar na rua, mas é só às
vezes. Enfim: e daí quando a parte amorosa deslancha, a gente não consegue se
aquietar e curtir por muito tempo. É triste, mas a gente vai vasculhar até
encontrar alguma paranoia que sirva de motivo pra um mal estar ou discussão.
Vamos sair do abraço na hora de dormir porque está muito quente, insistir em
saber como era a ex, dormir só com 'boa noite'; deixar que a demência segue a
lucidez de ser a mulher que eles escolheram pra chamar de amor, quando na
cozinha.
Pode ter sido o final de semana
mais bonito em meses, a paixão ser expressa em mil abraços e palavras doces, o
sexo no ponto mais alto da libido de quem sente a falta durante a semana, a
sintonia afinada capaz de compor o momento da melhor forma possível, que não
adianta: é dom de quem usa saias acatar ao monstrinho dos zunidos que falam na
mente pra que a gente atente bem, seja observadora pra não ser feitas de
idiotas; inconfortáveis e sem saber o que fazer com a perfeição possível de um
momento em mãos, arriscamos um pouco de frieza, nos dispersamos na discussão
fútil que não sabemos mais porque teve início,
embarramos na ingenuidade de quem só quer passar por uma rusga ou outra
tirando sarro da própria obsessão, rindo à toa pra não se perder nas mil e uma
ideias próprias, amando mais porque a gente só consegue fechar os olhos e
respirar mais lento quando as certezas estão todas no lugar. Geralmente, depois
de uma briga boba ou outra que certifique que tudo nunca esteve melhor.
Camila Paier
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